domingo, 15 de agosto de 2010

Embriaguez


Era ainda uma menina quando aprendeu a voar.
Seu sorriso generoso deixava ver os dentes separados e
aquelas sardas, que ela dizia detestar, lhe assentavam um ar travesso
- Como convinha a uma menina que voava.

Havia aqueles que do chão não tiravam os pés, nunca,
e outros, cuidadosos, que estavam sempre a lhe prevenir:
Menina, menina, voando tão alto, pode um dia se machucar.

A vida é longa, ela dizia. Estou recolhendo histórias
para contar mais tarde, bem mais tarde,
quando finalmente não puder mais voar.

Mas, o tempo, inquieto, corria na terra, voava nos céus.
E lá no alto, a menina só pensava em ser feliz,
Vendo e fazendo coisas e cultivando histórias
Como se a vida fosse um vôo sem fim.

E ela voava cada dia mais alto e não pensava em voltar.
Seus olhos foram ficando embaçados, cheios de nuvens.
Quase sempre embriagada dos ventos que sopravam lá no alto.

Em seu vôo cambaleante pela vida, guarda ainda o jeito de menina,
persistentes sardas no rosto e os dentes separados
- mas cadê sorriso pra mostrar?
A menina nem se lembra das histórias que guardou para contar.

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