segunda-feira, 31 de maio de 2010

Asas

Não existe sonho mais bonito,
Sonho de verdade, de sonhar dormindo,
Do que o de estar voando.

Por que será que DEUS não quis dar aos homens
Como prêmio talvez, por qualquer motivo
Um par de asas bem bonito?

Diversão


Caiu uma chuva boa e mansa.
Logo depois o sol voltou a brilhar
Na folha de lótus ficou uma pequena poça
Esquecida, brilhava como diamante.
O vento balançava a enorme folha
De lá pra cá, de cá pra lá.
A pocinha parecia criança
Divertindo-se no balanço do parque.

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Desencontro

Eu te vi na rua.
Em sentido contrário ao meu – do outro lado.
Era você, simplesmente vindo.
Quisera tanto que me visse!
Ai quem me dera que não me visse!

Não assim, quebrantado.
Esse calor queimando o peito,
enrubescendo o rosto,
Essa voz, eu sei, desgovernada.
Ah, como eu queria que não me avistasse!

Você passou e eu desejei tanto que me olhasse
E eu te daria um sorriso fácil, de todo dia,
Aquele ‘tudo bem’ que se diz a qualquer um.
A voz sem tropeços, corriqueira...
E do meu coração desgovernado
Nem de longe se apercebesse.

Ah, como eu queria, de qualquer forma,
Apenas que me notasse.

sábado, 15 de maio de 2010

MARÇO


A tarde é densa, cheia de calor.
O céu estampa cores fortes
Como numa loja de tecidos indianos.
Tenho vontade de correr de braços abertos
Mas os pés se inibem.
Os braços não se erguem.

Coração, assim, crispado de ansiedade.
Imagino música, receio olhares.
De quais sentimentos se faz o momento?
Não os defino, não os escolho.
Todos eles parecem arder em meu peito.

É somente mais uma tarde,
Eu receio ter dito,
É somente mais uma tarde,
Eu receio ter fingido.

domingo, 9 de maio de 2010

RETORNO


Era ainda manhã quando o carro parou na frente da casa.
Havia um portão grande, de ferro, por onde se via o quintal. Via-se também grandes árvores, antigas, e debaixo de uma delas um banco de madeira, alisado pelo uso, envelhecido pela longa exposição ao tempo, coberto de folhas, como a dizer que há muito não era usado.

Para ele, aquelas árvores eram novidade, mas a casa não. Mesmo assim, olhou o número como a confirmar que era ali mesmo.

Com uma das mãos no portão, o homem olhou a casa, depois voltou o olhar para a rua e, por um longo momento, considerou que talvez devesse tocar a campainha da porta principal. Deu alguns passos em sua direção, mas, mudou de ideia.

Seus movimentos eram lentos e ele concluiu que isso se devia à longa viagem na qual ele dirigira toda a noite. Desde que recebera o telegrama, pensou ele. Talvez, depois de um bom café, as coisas voltem ao ritmo normal, pensou novamente.

Percorreu alguns metros, passando embaixo das árvores até alcançar a porta dos fundos. Olhou lá dentro, ‘ainda’ era a cozinha, e depois o corpo da casa, envolvido pela penumbra da manhã. Ouviu vozes suaves vindas lá de dentro, antigas como as árvores, e sentiu uma ligeira contrariedade.

Apertou um pouco os olhos e viu lá dentro um homem de cabelos brancos, de óculos, que, num movimento quase simultâneo também o olhou. Enquanto vinha em sua direção, sem pressa, ele reconheceu o jeito de andar, os olhos também apertados, tentando identificar aquele homem parado na porta de sua cozinha. Parecia buscar em um canto esquecido, numa gaveta que há muito não se abria, uma fotografia. Segurava em suas mãos um papel que estava lendo, enquanto andava em direção a ele.
Eram gestos comedidos, duvidosos, quando o visitante disse:
- Pai?
Era um chamado, mas também uma interrogação.

O pai sentiu um breve estremecimento, uma angústia descabida, quase uma fraqueza a tomar conta de seu corpo, sem saber se estendia a mão ou se abria os braços e acolhia aquele homem parado à sua porta. Sentiu-se inseguro naquele gesto tantas vezes ensaiado. E dele se ouviu uma voz cansada, surpresa, que também soou como uma interrogação.
- Filho?

Então, eles se reconheceram e se abraçaram, indecisos.

Estavam quase tímidos assim tão próximos. Havia tanta coisa a perguntar, a comentar, mas, tudo parecia ter se perdido no tempo.
O pai olhava o filho e perguntava lá dentro do seu coração: ‘por quê tanto tempo? O caminho que te levou não te ensinou a voltar?’ - Tinha vontade de saber o que rompeu, se ele não sentiu saudade, mas, a voz estava embargada, parecia uma mágoa. O tempo...

O filho perguntou antes: “E a mãe, como está”?
O pai respondeu que ela estava lá dentro, deitada. Estava enfraquecida pela doença. Por isso ele havia enviado aquele telegrama. Não sabia se o endereço ainda era o mesmo. O neto havia procurado na internet. O neto, filho de sua irmã...

Irmã... Ele tinha uma irmã. E também sobrinhos... De novo aquela contrariedade fez sombra em seu olhar.

E o pai continuou a dizer-lhe, sem pressa, sem alterar a voz, que enviou o telegrama: sua mãe... “doença ruim’... se quiser... se puder... O pai quis olhá-lo, examiná-lo, confirmar o tempo na cor do cabelo, nos vincos do rosto, mas, teve receio, faltou intimidade. Quanto tempo? Quando saiu de casa contava 20 anos, agora - quase 50.
De novo sentiu um breve estremecimento. Queria saber o que houve, se tinha mulher e filhos, mas, o tempo...

Ao invés disso, o pai perguntou-lhe se queria ver a mãe. Ele respondeu que sim, levantou-se lentamente e entrou na casa. A mesma casa, algumas mudanças, mas, a mesma casa. Como ele mesmo.

Ao entrar no quarto, as janelas estavam abertas, e ele viu uma mulher abatida, ainda bonita, que o olhou assim que atravessou a porta e a luz da janela iluminou-o como se estivesse num pequeno palco.

- Filho?
Ele quis responder, quis dizer tanto, mas, uma grande contrariedade inundou-lhe os olhos, o coração.

Ela perguntou: ‘por quê’? Tão baixo como só o coração sabe dizer.
Ele não soube, nunca saberia responder. Quem sabe – culpa do tempo...

V I D A

Abre-se a grande roda
Girando, girando, girando
Te espera o mundo.
De repente, lá no meio
É você girando...
Girando e brincando e girando.

O círculo cresce.
E você girando, girando
Num frenesi alucinado.
Quer sair da roda?
Impossível!
O tempo passando e você...
O tempo girando e você.

O círculo se fechando
E você lá no meio, girando
Girando... mais devagar
Devagar, o círculo se fechando
Brincadeira acabando...
Girando devagar, até parar.
É você no meio
Inerte ... sozinho.

sábado, 1 de maio de 2010

Divisas


A placa indica: logo à frente é divisa de estados;
Outra, alerta que é preciso reduzir a velocidade;
Vou seguindo, atenta, como tantas vezes o fiz.
Tantas vezes como se nunca o tivesse feito.

Um pensamento infantil me cutuca:
Quem calculou as fronteiras?
Riscou o chão e empunhou a placa?
Agora é este, antes o outro.

Indiferente, o carro percorre o caminho,
Ultrapassa a fronteira e segue em frente.
O que há com meus olhos?
Pergunta-me o mesmo pensamento infantil.

Não sei bem de onde surgiu essa tristeza.
Acho que percorreu os mesmos caminhos,
Sequer viu a placa e seguiu-me até aqui
E sentou-se ao meu lado.

À sombra em Parati


Era um dia quente do mês de janeiro.

Minhas irmãs e eu fomos conhecer a cidade de Parati, no Rio de Janeiro, em pleno verão.
O calor caía pesado, mas havia no ar aquele cheiro bom de novidade. As ruas cheias – tanta coisa para ver, tanta gente para andar naquele calçamento difícil.
Sacolas, em número cada vez maior, iam guardando as novidades.

Em algum momento dessa procissão sem santo, eu parei e disse que elas poderiam continuar a caminhada, eu ficaria ali, naquela praça de árvores imensas, de frente para a igreja, esperando. Queria descansar, queria olhar apenas.

A praça, afastada do centro agitado do comércio, parecia um oásis. Alguém sentado em frente à igreja, esperando, e eu, sentado entre árvores frondosas, observando, registrando coisas simples, sem barulho, sem corre-corre, sem sacolas, sem o sol a castigar a pele desacostumada dele.

De repente, do outro lado da rua, uma criança, mais ou menos 8 anos, em cima de uma carroça igual a tantas que circulam pela cidade, parada também à sombra, e seu cavalo – ar de cansaço, enfado.
Ao lado dele, quase embaixo, outra criança, bem mais nova, talvez uns quatro anos, olhava fascinado o cavalo que mastigava (ou era o freio que o incomodava). Pareciam extraídos de uma fotografia – um triângulo: uma criança pobre numa carroça olhava intrigada outra criança, turista admirada, que olhava um cavalo que nada via, apenas mastigava.

E eu lá, do outro lado da praça, observava os três com enlevo.

De repente, apareceu uma menina, com seu vestido de flores, também não devia ter mais que quatro anos. Na ponta daquela calçada muito alta, coisa de cidades antigas, ela parou, inclinou o corpo para frente, segurando a barra do vestido, e gritou para o menino que olhava o cavalo:
- Artur!
Ele não a ouvia – não porque estivesse longe, mas porque estava fascinado.
- Artur, vem, mamãe tá esperando!
Nada.
Os “erres” muito bem pronunciados, o corpo inclinado para frente e seu vestido de flores e, eu lá, embevecido.
- Arrrturrr, vem. Sai daí, Artur, ele vai te morrrderrr – referindo-se ao cavalo.
Artur virou-se e disse, solenemente:
- Não vai não, esse “cachorro” não morde.